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Zero de Conduta

Zero de Conduta

25
Ago08

para acabar de vez com a tanga do turismo olímpico

Pedro Sales

A propósito dos posts que eu e o maradona fomos escrevendo sobre os críticos da prestação portuguesa nos Jogos Olímpicos, O Rodrigo Moita de Deus diz que, de repente, “todos se lembraram de dizer mal do futebol”, esse nicho de qualidade e excelência que rompeu com a mediania desportiva nacional. Comecemos pelo óbvio. Faz tanto sentido dizer que alguém que assina como maradona "anda a dizer mal do futebol", como classificar de anti-comunista o tonto que acaba de chamar José Estaline ao filho. Pela parte que me toca, e enquanto o Hugo Viana se mantiver longe de Alvalade, também nada me move contra o futebol (estando até a mentalizar-me para resistir aos 238 trocadilhos idiotas que a imprensa vai inventar com o nome do novo avançado do Porto).*

 

Até concordo com quase tudo o que diz o Rodrigo (**), a começar pela natural constatação de que o futebol é o ultimo a poder ser culpado pelo desinteresse generalizado que os portugueses nutrem pelas restantes modalidades, mas a verdade é que o seu post nada nos diz sobre o clima mental que se instalou no país enquanto o Nélson Évora não saltou 17 metros e 67.


Vale a pena recapitular. Partindo de uma representação nacional que em nada se distinguiu pela negativa das anteriores, a imprensa começou a dar como certo que os atletas nacionais não tinham "brio", "honra" e "ética". Depois já não eram os resultados, eram as desculpas. Pouco interessava que as "desculpas" até nem se tenham destacado face à das restantes delegações. O veredicto estava traçado. Foram fazer turismo olímpico, ainda por cima à custa dos nossos impostos, começaram a escrever uma dúzia de colunistas, apenas interessados nos resultados de Pequim para confirmar que o nacional porreirismo é um fado nacional que nos condena como povo. Foi o que fizeram, só para dar dois exemplos mais recentes, o Henrique Raposo e o Alberto Gonçalves. Este último, capaz de pérolas  retóricas como “correr e saltar são exercícios de que qualquer bruto é capaz”, encontra a justificação suprema para a pequenez dos portugueses nas declarações de Gustavo Lima – que, em três olimpíadas, teve num 6.º lugar o seu pior resultado – e numa atleta que “ficou em 46.º lugar (entre 50)”. Ora, até mesmo o Alberto Gonçalves tem condições para perceber que essas 50 foram as que obtiveram os mínimos olímpicos - um rigoroso critério de selecção da elite mundial. Não é “46.º lugar (entre 50)”. É a 46.ª melhor do mundo na sua actividade.

 

Mas, que é isso, para o prolixo colunista? Como todos sabemos ninguém pára o Gonçalves. Ele são as palestras em Yale, Cambridge, Harvard e as constantes edições na Oxford University Press. Com tanto trabalho, de um dos 46 mais conceituados sociólogos do mundo, quem é que pode levar a mal que ele - e aos outros que se lhe juntaram na desbunda - ande para aí a criticar a preguiça nacional?

 

*. Hulk.

**. as restantes objecções ao texto do Rodrigo encontram a resposta nesta fotografia que o maradona colocou no seu blogue. Mas também podíamos falar no ABC, um clube que, num país sem tradição em andebol, conseguiu ir a 2 finais europeias de clubes.

22
Ago08

Ainda a tanga do turismo olímpico

Pedro Sales

Não sei como é que o campeões de sofá ainda não repararam, mas o turismo olímpico não começou em Pequim. Há quatro anos, em Atenas, um desses atletas sem "brio", "honra" e "ética" fez o quarto pior resultado na sua modalidade.  Mais um fraco “que não aguentou a pressão” e que se divertiu à custa dos nossos impostos, tendo mesmo conseguido a proeza de terminar a sua participação com um resultado inferior ao que fazia quando ainda era júnior. O seu nome? Nélson Évora.


É um exemplo limite, mas que permite perceber a estupidez de usar o exemplo de atletas na sua maioria amadores, e que correm perante 200 pessoas no Estádio Universitário, para fazer umas graçolas com pretensão a leitura psicanalítica sobre a incapacidade lusitana para vencer e da ausência de uma mentalidade vencedora como fado lusitano.


As cíclicas depressões nacionais têm destas coisas. Exigem cada vez menos matéria para a sua combustão. Nem que se trate de crucificar atletas que fizeram os exigentes mínimos olímpicos e que, mesmo treinando a desoras e normalmente depois do trabalho ou faculdade, estão entre os melhores do mundo. Não ganharam 23 medalhas, é verdade, mas desde quando é que isso era suposto acontecer? E a Irlanda, Suécia, Grécia ou Bélgica, que ainda não levaram nenhuma medalha de ouro, e que estão a ter uma participação inferior à portuguesa? Também serão uns indolentes sem capacidade de vencer? Condenados à mediocridade porque não se conseguem superar nos momentos decisivos?


Verdade, verdadinha é que confrangedora ignorância da maioria da opinião publicada e da imprensa que percebe tanto de desporto como eu de física quântica, se está nas tintas para os atletas, interessando-lhes apenas mais um motivo para fazer umas tiradas sonoras sobre a pequenez da "alma lusitana" e do nosso triste destino. Os olímpicos de Pequim são apenas um pretexto para exultar com a humilhação dos “derrotados”. Que, pelo caminho, estejamos a criar as condições para perder uma dúzia de excelentes atletas que, como o Gustavo Lima, não está para aturar estas merdas, está longe de lhes merecer um pingo de atenção.

19
Ago08

Num país onde ninguém gosta de desporto, todos querem medalhas

Pedro Sales

Um país que não gosta de desporto acorda, de quatro em quatro anos, em sobressalto público com a participação dos atletas olímpicos. Comentadores televisivos, imprensa e blogosfera unem-se em coro para encontrar os culpados pela “lamentável”, “confrangedora”,”patética” e anedótica delegação nacional. Não passa pela cabeça de ninguém que num país em que existem três jornais desportivos diários que nunca falam de desporto, mas das contratações e tricas do mundo do futebol, dificilmente existe espaço para aparecerem desportistas de elite. Sem interesse mediático não há interesse comercial. Os clubes não funcionam sem dinheiro e só por anedota se pode falar de desporto escolar. As empresas portuguesas não apoiam o desporto. Investem nos nomes que ganham projecção internacional. É normal. Os portugueses não gostam de desporto. Gostam de ver “os seus” ganhar “lá fora”.


Mas a sanha está apertada e o país quer sangue. Os atletas não tiveram "brio", nem “orgulho nacional”. Como dizia hoje a SIC, houve participações “menos éticas”. Umas declaração manifestamente infelizes sobre as saudades da caminha, a arbitragem e umas provas em que os atletas estiveram longe do seu melhor foram projectadas a tragédia nacional. É preciso o sentido das coisas. Pouco éticas foram as participações dos únicos atletas nacionais que ganham dinheiro a sério e que acabaram um europeu e um mundial ao soco e à chapada aos árbitros. Curiosamente, as mesmas vedetas que enchem as capa dos jornais desportivos e que, quando se juntam, partem os balneários e vão aos J.O de Atenas perder com a selecção de futebol do Iraque em guerra.


Na RTP, um comentador resumia a coisa. A participação de João Neto, nono classificado na sua prova de judo, acabou “sem glória nem honra”. Sem honra, veja-se bem. Compreende-se bem as palavras de Gustavo Lima, depois de anunciar que abandona a vela. Sem dinheiro, mas com sacrifico pessoal as coisas ainda se aguentam, agora “para andar a ouvir frases como os portugueses andam a gastar o dinheiro dos contribuintes eu prefiro sair fora e sair de consciência tranquila”. Não deve ser o único.
 

19
Ago08

Num país onde ninguém gosta de desporto, todos querem medalhas (II)

Pedro Sales

O problema do desporto português não são as desculpas dos atletas, a isso obrigados pela pressão de uma imprensa que não percebe nada de desporto e que julga que se ganham medalhas olímpicas como quem vai à praia. O problema é que não existem escolas desportivas. Os russos podem ter ganho poucas medalhas na natação e os americanos podem ter levado um banho na velocidade, mas têm uma escola. Depois dos atletas que levaram a Pequim, mal ou bem sabem que terão outros de topo em Londres. Em Portugal não. Vivemos do génio e carolice de alguns malucos que, quase sempre depois do trabalho, encontram tempo e motivação para treinar. Mas num país com dez milhões de habitantes, a conjugação do génio com o espírito de sacrifício acontece com a mesma frequência que um eclipse lunar. É quando ganhamos medalhas. Tivemos uma escola. A do Sporting, no meio fundo e fundo do atletismo. Acabou em menos de uma geração, com o abandono de Moniz Pereira. O melhor saltador nacional salta menos dois metros do que Nelson Évora. Quando ele e a Naide abandonarem deixamos de ter atletas de elite mundial nos saltos do atletismo. Com sorte, pode ser que apareça um no remo ou na marcha. É a diferença entre os países em que se percebe a importância do desporto e Portugal, onde os principais protagonistas desportivos são os árbitros de futebol.

19
Ago08

Têm a certeza que querem medalhas? (II)

Pedro Sales

O presidente da delegação olímpica da Austrália está a pressionar o governo para que mantenha o actual investimento, de 126,8 milhões de euros anuais, até aos J.O de 2012. São 507 milhões em quatro anos. O orçamento da delegação portuguesa no mesmo período foi de 15 milhões de euros. Mesmo representando o maior investimento público de sempre numa delegação nacional, a Austrália investe 33 vez mais dinheiro do que Portugal. Eles têm 35 medalhas, Portugal tem uma. Estas coi$as contam. Têm a certeza que querem medalhas ou é só conversa? É que os outros não andam a dormir.

19
Ago08

Têm a certeza que querem medalhas? (III)

Pedro Sales

Rui Santos, na SIC Notícias, dizia que temos que comparar a nossas medalhas com países que têm a nossa dimensão. Como a Holanda, explica. As coisas são como são, e talvez valha a pena lembrar que a Holanda tem um banco, o Rabobank, que investe tanto no ciclismo como a totalidade das empresas nacionais em todo o desporto extra futebol. No seu site, podemos ler que o investimento na cultura e desporto reforça a sua imagem social, investindo no ciclismo, hipismo e hóquei em campo. Profissional e amador, lançando novos atletas. É toda uma diferença cultural que produz resultados. A competição ainda não acabou, e já ganharam três medalhas nestas modalidades, e vão bem lançados para ganhar o hóquei feminino e masculino. Este é um exemplo, mas podemos falar em dezenas deles. Se ninguém vai ver um jogo de andebol, e se as audiências das transmissões da liga são os familiares dos atletas, por que raio é que as empresas quererão gastar o seu dinheiro a promover o que ninguém quer ver?

10
Ago08

Que se lixe o “espírito olímpico”

Pedro Sales

O sucesso dos Jogos Olímpicos não tem nada a ver com o “espírito olímpico”, como somos obrigados a ouvir centenas de vezes durante os comentários televisivos. O espírito olímpico não passa de uma versão reciclada do código de conduta dos clubes de cavalheiros britânicos. O que interessa é competir, claro, desde que tenhamos a certeza que ganha sempre “um dos nossos”. Era este o espírito olímpico de um barão anafado e vagamente misógino. A glosada pureza do amadorismo não passava disso mesmo. De uma desculpa para uma elite económica se perpetuar como rainha e senhora dos “seus” desportos. Os “meus” Jogos são os de Jim Thorpe. Unanimemente considerado um dos melhores atletas do início do século XX e a quem o espírito olímpico retirou as suas medalhas. O seu crime? Ter jogado uns jogos para ganhar a vida. De ascendência índia, teve o azar de não ter nascido no selecto ambiente social onde era elegante correr os 400 metros depois de acender o charuto na pista de corrida, nem nunca lhe terem dado a conhecer as regras da gentlemanship, semanalmente louvadas por João Carlos Espada. Por mim quero apenas ver os melhores atletas. Quem quer ver amadores pode ir ao sábado de manhã ver os jogos de futebol no campo da Inatel ou ver um desafio de pólo na Quinta da Marinha.

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